Vanessa e Sophie: sonhos e futuro interrompidos pelo feminicídio
Vanessa foi a 13ª vítima de feminicídio em Mato Grosso do Sul em 2025, e Sophie, a 14ª; a bebê é a vítima mais nova já registrada no estado
Em 26 de maio de 2025, Vanessa Eugênio Medeiros, de 23 anos, e sua filha, Sophie, de apenas 10 meses, se tornaram vítimas do feminicídio em Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul.

A tragédia, além de chocar o estado, deixou um vazio no coração de Wesla Eugênia, irmã mais velha de Vanessa. Para além das estatísticas da violência contra mulheres, a caçula da casa é lembrada como uma jovem cheia de sonhos.
“Ela era muito sonhadora, sempre fazendo planos. Queria terminar a faculdade de moda, abrir uma lojinha online, comprar um carro e colocar a Sophie numa boa escola”, conta Wesla. Vaidosa e criativa, Vanessa adorava mexer com cabelos e maquiagem.
O momento mais feliz de Wesla com a irmã foi quando descobriu que seria tia. Além de ter sido a primeira pessoa a saber, foi escolhida para ser madrinha da bebê. “Eu era louca para ser tia e madrinha, e ela me deu esse presente”, disse.
A chegada de Sophie na família foi maravilhoso para toda a família de Vanessa. “Eu tenho um filho, um menino, e daí a Vanessa teve a Sophie, a primeira menina. A gente ficou muito feliz, a Vanessa estava feliz, contente. A Sophie chegou super saudável. Era uma criança muito esperta; aprendeu a rolar muito cedo, a engatinhar muito cedo. A Sophie era uma benção na nossa família. Ela foi um presentinho que Deus mandou para a gente, para a Vanessa.”

Porém, em meio às alegrias, Wesla se recorda de situações que hoje soam como alertas. “Uma vez ela me mandou mensagem perguntando se eu cuidaria da Sophie caso acontecesse algo com ela ou com o João. Eu insisti se estava tudo bem, mas ela dizia que sim.”
A irmã mais velha também notava o comportamento frio de João dentro de casa. “Ele chegava, não dava boa tarde, passava direto. Vanessa pediu para ficar com a bebê para ela tomar banho, ele pegava no colo, colocava no berço, ou no tapetinho, ia pro quarto, jogar. Quando chorava, falava que era para deixar, para ela aprender. Vanessa parecia cansada, mas sempre dizia que estava tudo bem.”
A brutalidade do crime deixou marcas profundas na família. “Meu pai não fala sobre, minha mãe precisou de tratamento para conseguir dormir. Eu mesma precisei de psicóloga. É uma dor que nunca passa”, desabafou Wesla, que, diariamente, lembra da irmã e da sobrinha.
“Eu tinha tanta coisa para viver. Os passeios, as idas ao shopping, ao cinema que a gente não foi, com a neném, com ela, levar numa numa brinquedoteca, a primeira vez da neném numa creche, indo para a escolinha. Nada disso a gente pôde viver. A gente não pode viver muita coisa com elas. E dessa forma, foi muito brutal o que ele fez. Era só ele ter ligado para a gente, me ligado, se ele não queria falar com a minha mãe, era só ele ter me ligado, ele tinha tinha meu número, ele tinha essa abertura, poderia falar comigo. Como eu já tinha falado para ele, eu já tinha pedido para ele que se ele visse que não dava mais certo, que largasse dela. Mas que ele não encostasse nela, não batesse na minha irmã, não encostasse na minha irmã. E ele ainda teve a cara de pau de falar que não ia fazer isso, que nunca faria isso, que amava ela. Mas não foi o que aconteceu… A Vanessa era muito reservada em relação ao relacionamento, ela só falava pra gente que tava tudo bem, e a gente achava que realmente estava bem. Hoje em dia a gente vê que talvez alguma coisa estava acontecendo, às vezes alguma agressão estava acontecendo e ela não queria falar… Mas só vão ficar perguntas jogadas ao vento, porque hoje em dia ela não pode responder.”
Wesla Eugênia, irmã de Vanessa
O crime
Na manhã do dia 27 de maio deste ano, o Primeira Página recebeu uma mensagem que faz qualquer redação jornalística parar e dar total atenção: corpo de duas pessoas, sendo uma delas um bebê, carbonizados em um terreno baldio no Indubrasil, em Campo Grande.

Imediatamente repórteres, editores e chefes, todos mobilizados para descobrir o local exato e deslocar uma equipe. A pergunta que todos faziam era quem seriam essas vítimas. Por que foram mortas de uma forma tão cruel?
Minutos depois, chega outra mensagem na redação: mãe e filha estavam desaparecidas. O marido estava em uma delegacia prestando queixa, dizendo que a esposa teria ido para um encontro de mães e não deu mais respostas.
Quem já está há tanto tempo na profissão, lidando com tantos casos de homens matando suas esposas e namoradas, não tinha outra suspeita: era um caso de feminicídio.
“Mas, como? O companheiro está denunciando o sumiço da esposa. Não é possível.’
É muito possível. É real. Infelizmente.
A notícia dos corpos foi escrita por quem escreveu essa reportagem. O lado amargo da profissão é essa, noticiar fatos tão tristes que fazem qualquer pessoa de bem ficar pensativa sobre até onde vai a maldade do ser humano.
Após apurações, equipes na rua, ligações intermináveis para fontes de segurança, a primeira confirmação. Corpo em chamas no fim da rua, com uma criança, aparentando ser menina, sobre o corpo de uma mulher.
Frieza e sem arrependimento
Na manhã do mesmo dia, a Polícia Civil prendeu João Augusto Borges de Almeida, 21 anos, após ele confessar detalhes perturbadores do assinato de Vanessa e de Sophie, na noite do dia 26 de maio. O motivo? Ele não queria pagar pensão alimentícia e decidiu “se livrar do problema”.
Vanessa e Sophie foram enganadas por João Augusto em casa, no Jardim São Conrado. Depois, ele enrolou seus corpos em um cobertor, levou para a região do Indubrasil e ateou fogo.

As imagens do crime, obtidas pelo Primeira Página, mostram o veículo de João chegando ao local por volta das 21h50 do dia 26 de maio. Minutos depois, as chamas já são visíveis à distância, seguidas da fuga do criminoso.
Na delegacia, João Augusto admitiu que já planejava o crime há cerca de dois meses e fez questão de dizer que não tinha arrependimento. A indiferença do rapaz surpreendeu delegado, investigadores e policiais.
A Justiça aceitou a denúncia apresentada pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul, tornando João Augusto réu pelos crimes de feminicídio, homicídio qualificado e ocultação de cadáver. A expectativa é que o julgamento do caso seja feito ainda neste ano.
Vanessa foi a 13ª vítima de feminicídio em Mato Grosso do Sul em 2025, e Sophie, a 14ª. A bebê é a vítima mais nova já registrada no estado.
🚨 Denuncie a violência contra a mulher
Violência doméstica, seja psicológica, física, moral ou verbal, é crime e precisa ser combatida. Saiba como denunciar:
- Emergência: se a agressão estiver acontecendo, ligue 190 imediatamente;
- Central de denúncias: disque 180. O atendimento é gratuito, sigiloso e funciona 24 horas por dia, todos os dias. Também é possível denunciar via WhatsApp: (61) 9610-0180;
- Presencial: procure a Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher), localizada na rua Brasília, 85 – Jardim Imá, ou a delegacia mais próxima;
Em Mato Grosso do Sul as denúncias de violência de gênero podem ser feitas de maneira on-line. Clique aqui e faça a denúncia.
⚠️ Violência contra a mulher não pode ser ignorada. Basta! Denuncie.

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